Porque
o problema do Brasil não é, isto está no meu último livro, que é o livro do
trânsito - “Fé em Deus, Pé na Tábua” - o problema do Brasil não é o problema da
desigualdade. A desigualdade é o que aparece na consciência. O problema real, o
fundo do iceberg, é a questão da igualdade. Nós somos uma sociedade desigual.
Todas as situações de igualdade nós nos sentimos mal. Esse "nós" eu estou falando
nós brancos, de classe media, relativamente ilustrados, e que temos uma posição
de um certo prestígio, ao longo, dentro de uma comunidade qualquer. Mesmo que
você seja um morador de uma comunidade e seja um negro, se você tiver algum
prestígio, se você entrar no Banco do Brasil e esperar mais tempo que o
necessário com aquela fichinha na mão que agora tem, está muito bem organizado,
as pessoas começam a se sentir impacientes. O trânsito é o espaço social onde
você vê isso com a maior clareza porque no trânsito tem um componente que é
importante e está no livro que se você por acaso desobedecer as regras do
trânsito você tem uma sansão, você causa um acidente. O que não acontece por
exemplo se você reclamar num banco, ou se você for mal educado numa fila, por
exemplo, da barca pra Niterói, (Câmera fecha close no Matta) ou de um ônibus,
se você não der o lugar pra uma pessoa deficiente ou pra uma senhora de idade
ou pra um senhor de idade, ou aqui na PUC, os meninos sentados nas escadas e
eu, não sou mais um jovem, não posso segurar no corrimão pra descer, não tenho
segurança pra descer a escada. Então, esse tipo de, essa discussão, esse é o
grande desafio brasileiro.
E como é que você chega na igualdade? Aí entra a
importância de um autor como Tocqueville. O que impressiona ele nos Estados
Unidos de mil oitocentos e trinta e poucos é exatamente, uma sociedade, como é
que pode ter um continente, ou meio continente – ou meio continente, naquela
época não tinham conquistado o oeste – mais um meio continente igualitário?
Onde a política, as pessoas participam da política. Porque a política se faz
num sentido local. E é num sentido local que forma a política nacional, porque
ele está lá antes da guerra civil, que depois resolve isso. Esses pontos são
pontos importantes e eu acho que são desafios que a gente tem que enfrentar
nesse final. Porque a gente está quase na metade do Século XXI e continuamos
sendo uma sociedade profundamente desigual.